São Luís se tornou a capital do reggae na década de 80

Ritmo jamaicano é o preferido da boa parte da população da cidadeAtualmente, o reggae emprega milhares de pessoas na capital.

Nesta terça-feira (8), São Luís completa 403 anos e na programação para comemorar o aniversário da cidade não poderia faltar o reggae. Conhecida como a “Jamaica Brasileira”, a capital maranhense ganhou este título ainda na década de 1980 quando o ritmo já havia se disseminado por todos os cantos da cidade e se tornando uma febre entre a população.

A história do reggae com São Luís começa na década de 1970. As explicações para a chegada do ritmo no Maranhão são muitas, mas talvez a tese mais conhecida seja a de que marinheiros que chegavam ao porto de São Luís e de Cururupu deixavam discos trazidos da Jamaica nas zonas de prostituição para pagar pelos serviços.

“Eles não tinham grana para pagar as mulheres então deixavam os discos que eram tocados nos prostíbulos e depois começaram a ganhar o gosto da população”, explicou o antropólogo e professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Carlos Benedito Rodrigues da Silva.
O reggae sempre teve raízes fortes na vida do ludoviscense (Foto: Biné Moraes/ O Estado)O reggae sempre teve raízes fortes na vida do
ludoviscense (Foto: Biaman Prado/ O Estado)
Em pouco tempo, o reggae já havia se difundido pela periferia da cidade e passou a conquistar adeptos pelo centro. O professor Carlos Benedito relembra que quando ele chegou para morar em São Luís, em 1981, o ritmo era ouvido em toda a cidade.

“Era assustador. Você ouvia o reggae em todos os lugares. A partir disso passei a pesquisar esse fenômeno que tomava as ruas de São Luís”, contou.

O que chamou mais a atenção do professor foi que no Maranhão o que se ouvia era o reggae roots, ou o reggae tradicional jamaicano. “Como que uma população que não fala inglês criou essa identidade tão grande com o reggae jamaicano? Então eu descobri através de pesquisas que o Maranhão tem uma relação muito grande com a Jamaica por conta grupos étnicos semelhantes da diáspora”, disse.
“Tem algumas semelhanças dos quilombolas jamaicanos com os encontrados no Maranhão, e também nos ritmos jamaicanos com os ritmos do tambor de crioula. Possivelmente essas pessoas foram trazidas do mesmo lugar
Carlos Benedito
Ou seja, o professor descobriu que as pessoas que foram trazidas escravizadas para o Maranhão e para Jamaica pertenciam aos mesmos grupos.

“Tem algumas semelhanças dos quilombolas jamaicanos com os encontrados no Maranhão, e também nos ritmos jamaicanos com os ritmos do tambor de crioula. Possivelmente essas pessoas foram trazidas do mesmo lugar”, disse Carlos Benedito.

A identificação com o ritmo foi tão grande que em pouco tempo o reggae se tornou a principal opção de lazer de São Luís através das famosas radiolas.

“Isso se enraizou de uma forma tão precisa aqui em São Luís que houve um tempo em que os proprietários de radiolas tiveram que viajar para buscar discos na Jamaica. Eles se tornaram verdadeiros expedicionários do reggae”, contou Fábio Araújo, presidente da comissão integrada do reggae e turismo de São Luís.
Maranhão Roots Reggae Festival começa neste fim de semana (Foto: De Jesus/O Estado)Fauzi Beydoun em apresentação da Tribo de Jah em um festival de reggae (Foto: De Jesus/O Estado)
Fábio Araújo conta que virou uma disputa para quem tinha o melhor e maior equipamento de radiola na cidade. Nos anos 1980, São Luís chegou a ter mais de 60 radiolas. “Era uma disputa para quem tinha mais raridades e exclusividades”, disse.
“O reggae se tornou no Maranhão uma potência geradora de emprego e renda. Um atrativo turístico também que impacta direta e indiretamente milhares de pessoas. Além disso, é uma expressão cultural tão forte que Jamaicanos passaram a vir para morar aqui para trabalhar com a música”, finalizou Fábio Araújo.
A história das radiolas
Na prática, a radiola é um equipamento que é rádio e vitrola. No Maranhão, com a disseminação do reggae, foram acopladas caixas de som ao equipamento com o intuito de aumentar sua potência para que o som pudesse ser ouvido em todos os cantos da cidade. Esses equipamentos ganharam tanta notoriedade que passou a existir uma disputa para quem possuía o melhor deles e tinha a maior variedade de músicas exclusivas para tocar.
Radiola Estrela do Som (Foto: Arquivo/ O Estado do Maranhão)Radiola Estrela do Som (Foto: Arquivo/ O Estado do Maranhão)

Na Jamaica havia o hábito de riscar ou raspar o nome dos cantores e das gravadoras dos discos. O reggae chega a São Luís também com essa prática. “Os donos das radiolas iam para a Jamaica comprar os discos e raspavam os selos. Então aquela música se tornava uma exclusividade daquela radiola”, explicou o professor Carlos Benedito.

Música do gueto
Assim como na Jamaica, o reggae em São Luís ganhou fama na periferia para depois chegar ao centro da cidade. Diz-se que o reggae expressa as angustias, sofrimentos e alegrias do povo.
Na Jamaica, a música também tem um conteúdo espiritual muito forte do rastafarianismo. Foi um ritmo criado nas periferias jamaicanas por uma juventude que encontrou na música um caminho de saída da marginalidade.
Fachada de casarão, no Centro Histórico de São luís, MA (Foto: Biaman Prado/ O Estado)Fachada de casarão, no Centro Histórico de São luís, MA (Foto: Biaman Prado/ O Estado)
Atenas brasileira
Oficialmente, São Luís é conhecida como a Atenas brasileira. Quando recebeu a nomenclatura extraoficial de Jamaica brasileira, o professor Carlos Benedito conta que o título não agradou boa da população da cidade. “ A Atenas brasileira é algo que remete a Europa e ser a Jamaica brasileira é algo que remete a África. E não agradou a elite”, disse.

Atualmente, porém os dois títulos se complementam. Para Fábio Araújo, a nova geração de regueiros tem se preocupado em conhecer a história da sua cidade e porque se tornou a Atenas brasileira. Isso tem se tornado presente nas músicas.
Do G1 MA

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